Segue o teu destino,
Rega a tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.
A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.
Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
como ex-voto aos deuses.
Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos Deuses.
Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.
Ricardo Reis, 1-7-1916
26 de mai. de 2010
16 de mai. de 2010
Escrevi um conto para a Revista Cultural Novitas e eles cometeram a insanidade de publicar.
Apesar disso, a revista é muito boa e pode ser lida aqui.
Apesar disso, a revista é muito boa e pode ser lida aqui.
11 de mai. de 2010
Fratura Exposta
Um erro conduz a outro erro e este, inevitavelmente, conduz a uma infinita cadeia crescente, repleta de erros sem fim.
Trabalho como quem suporta o peso de muitas pedras sobre a fragilidade do dorso; também por isso preciso habituar-me ao erro. Para correr riscos e acumular oportunidades conquistadas preciso estar disposta a assimilar o convívio com os erros que, à maneira de todas as outras sombras e aflições, encontrarei pelo caminho que desejo longo e pedregoso.
Seria fácil conviver com os erros se eles não fossem julgados; se eu não fosse julgada a partir deles. Seria simples se os incapazes de correr os riscos e os infelizes não estivessem à espreita, aguardando o anúncio de mais um erro para descarregar em mim as frustrações que mantêm em suas armas sempre engatilhadas. Sou um alvo dócil, quase receptivo. Talvez errar fosse mais fácil se eu não me soubesse tanto, se não conhecesse cada uma das dores de estar em mim. Sei, por exemplo, que não sou uma ilha. E saber-me percebida de modo equivocado é uma das maneiras mais fáceis de paralisar.
Mesmo que Sartre tenha razão e sejam eles o inferno, não há outra fuga que não a arte. Não há em mim outro caminho possível além das palavras e do movimento. Logo eles, tão singulares, meios em que não existem probabilidades matemáticas que subtraiam os riscos da incompreensão.
Aprendi, durante os últimos trinta anos, alguma coisa sobre [falta de] talento e idiossincrasias. Aprendi também sobre o trabalho e a persistência. Sobre amor e dedicação. Sobre a alegria da dedicação quando há amor ao trabalho.
Talvez consiga dedicar os próximos trinta a correr riscos enquanto, em vão, procuro compreender a multiplicidade dos erros sem explicação, que são todos. Errando mais, talvez aprenda a me divertir com eles, depois que a tristeza – inevitável – passar.
Trabalho como quem suporta o peso de muitas pedras sobre a fragilidade do dorso; também por isso preciso habituar-me ao erro. Para correr riscos e acumular oportunidades conquistadas preciso estar disposta a assimilar o convívio com os erros que, à maneira de todas as outras sombras e aflições, encontrarei pelo caminho que desejo longo e pedregoso.
Seria fácil conviver com os erros se eles não fossem julgados; se eu não fosse julgada a partir deles. Seria simples se os incapazes de correr os riscos e os infelizes não estivessem à espreita, aguardando o anúncio de mais um erro para descarregar em mim as frustrações que mantêm em suas armas sempre engatilhadas. Sou um alvo dócil, quase receptivo. Talvez errar fosse mais fácil se eu não me soubesse tanto, se não conhecesse cada uma das dores de estar em mim. Sei, por exemplo, que não sou uma ilha. E saber-me percebida de modo equivocado é uma das maneiras mais fáceis de paralisar.
Mesmo que Sartre tenha razão e sejam eles o inferno, não há outra fuga que não a arte. Não há em mim outro caminho possível além das palavras e do movimento. Logo eles, tão singulares, meios em que não existem probabilidades matemáticas que subtraiam os riscos da incompreensão.
Aprendi, durante os últimos trinta anos, alguma coisa sobre [falta de] talento e idiossincrasias. Aprendi também sobre o trabalho e a persistência. Sobre amor e dedicação. Sobre a alegria da dedicação quando há amor ao trabalho.
Talvez consiga dedicar os próximos trinta a correr riscos enquanto, em vão, procuro compreender a multiplicidade dos erros sem explicação, que são todos. Errando mais, talvez aprenda a me divertir com eles, depois que a tristeza – inevitável – passar.
7 de mai. de 2010
Biblioteca: Primeira Estação
Os livros dedicados à dança me afligem porque quase todos os que li me decepcionaram. O fato de alguns livros tratarem de assuntos extra-literários não os dispensa de serem escritos para que o leitor encontre também nas palavras e na forma do texto, e não só em seu conteúdo, algum prazer.
Com Primeira Estação vivi uma experiência diferente de todas as anteriores.
Confesso que, a princípio, o livro me assustou a ponto de parecer repulsivo. Durante alguns meses o vi como mais um livro belíssimo para ser deixado na estante, para ser usado em consultas esporádicas ou como fonte de inspiração. Senti muito medo do que encontraria nas páginas absurdamente lindas e bem encadernadas em que textos intercalam-se com imagens divinas dos espetáculos da São Paulo Companhia de Dança.
Vencida pela combinação irresistível entre tempo e curiosidade, decidi me dedicar à leitura, há um ou dois meses. Se os textos fossem ruins, teria o consolo das imagens que poderia admirar, com as quais poderia me entreter durante horas.
No índice, a primeira surpresa: Modesto Carone, também conhecido como “O” tradutor do meu amado Franz Kafka, é autor de um dos ensaios que compõem o livro. Livro esse que, para minha satisfação e deleite, além de ser um dos mais bonitos que habitam a minha estante – preciso escrever mil vezes que a edição é primorosa – é um passeio saborosíssimo por universos paralelos que, por motivos diversos, convergiram nas irresistíveis páginas que devorei em apenas dois dias.
Primeira Estação, como diz o subtítulo, reúne ensaios sobre a São Paulo Companhia de Dança. Os autores dos ensaios observaram a Companhia sob ângulos diversos, desde a concepção da Companhia e os testes com bailarinos até a estréia e os espetáculos que a seguem, e o resultado, irretocável, não poderia ser melhor.
O fato de nem todos os autores serem bailarinos ou “pessoas do palco” dá ao livro um tempero diferente – embora os textos dos artistas da dança não sejam menos brilhantes do que os dos autores não-dançantes. O livro é para ser lido por quem deseja conhecer o princípio da história de uma companhia recém-nascida ou para quem deseja aprimorar o olhar sobre a arte que dizem ser pouco valorizada em nosso país. A diversidade entre os autores que observam e descrevem o dançar é o que torna os textos de que é composto o livro, que poderia ser apenas belo, mais atraentes.
O leitor de Primeira Estação pode não conhecer nenhum balé de repertório e nem sequer saber em que consiste um plié, mas, se não terminar o livro transformado – como provavelmente acontece com os que, como eu, são, por ofício, dançantes - , certamente guardará a experiência enriquecedora para, quando solicitado, lançar sobre a dança – ou qualquer outra manifestação do corpo – um olhar mais apurado e generoso; de quem, no decorrer de algumas páginas, conheceu parte do que a dança tem de melhor.
Primeira Estação: Ensaios Sobre a São Paulo Companhia de Dança - edição bilíngüe (português/inglês); Inês Bogéa (Org.) - 336 páginas - Imprensa Oficial
6 de mai. de 2010
Então...
"DÉA é o crescendo de um beijo. PAULI boa sequência. NO denota certo desinteresse - se não for esse o sentimento, sugiro emendar nova palavra."
Parte da divertida Beijologia, por Michel Melamed.
Parte da divertida Beijologia, por Michel Melamed.
Sobre a separação dos corpos
A desordem que excede os poucos caracteres avança pelas páginas em branco e assim permanece. As palavras agora encontraram o vinho, flertam com o corpo, a divindade e as sensações de Baco, mas continuam em busca da coerência e da concisão. Embriagamo-nos e sorrimos, mas não nos compreendemos. Incapaz de enxergar através delas, sinto-me opaca e densa, intransponível. Incompleta, já não espelho. Demasiadamente tristes, também a elas falta coragem para entreolharem-se quando libertas das mãos frias, quase mortas, que um dia consistiram a sólida ponte sobre o abismo de que somos margens complementares. Seres distintos em existências equivocadamente aproximadas, frouxidão de nós. Amores não correspondidos e, por isso, inadequados. Páginas e esforços em vão. Os dias e suas horas mal empregados em encontros estéreis. Investimentos esperançosos em signos e símbolos frágeis, condenados ao fracasso outonal.
Cientes da inutilidade mútua seremos livres, talvez.
Cientes da inutilidade mútua seremos livres, talvez.
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