7 de mai. de 2010

Biblioteca: Primeira Estação



Os livros dedicados à dança me afligem porque quase todos os que li me decepcionaram. O fato de alguns livros tratarem de assuntos extra-literários não os dispensa de serem escritos para que o leitor encontre também nas palavras e na forma do texto, e não só em seu conteúdo, algum prazer.
Com Primeira Estação vivi uma experiência diferente de todas as anteriores.
Confesso que, a princípio, o livro me assustou a ponto de parecer repulsivo. Durante alguns meses o vi como mais um livro belíssimo para ser deixado na estante, para ser usado em consultas esporádicas ou como fonte de inspiração. Senti muito medo do que encontraria nas páginas absurdamente lindas e bem encadernadas em que textos intercalam-se com imagens divinas dos espetáculos da São Paulo Companhia de Dança.
Vencida pela combinação irresistível entre tempo e curiosidade, decidi me dedicar à leitura, há um ou dois meses. Se os textos fossem ruins, teria o consolo das imagens que poderia admirar, com as quais poderia me entreter durante horas.
No índice, a primeira surpresa: Modesto Carone, também conhecido como “O” tradutor do meu amado Franz Kafka, é autor de um dos ensaios que compõem o livro. Livro esse que, para minha satisfação e deleite, além de ser um dos mais bonitos que habitam a minha estante – preciso escrever mil vezes que a edição é primorosa – é um passeio saborosíssimo por universos paralelos que, por motivos diversos, convergiram nas irresistíveis páginas que devorei em apenas dois dias.
Primeira Estação, como diz o subtítulo, reúne ensaios sobre a São Paulo Companhia de Dança. Os autores dos ensaios observaram a Companhia sob ângulos diversos, desde a concepção da Companhia e os testes com bailarinos até a estréia e os espetáculos que a seguem, e o resultado, irretocável, não poderia ser melhor.
O fato de nem todos os autores serem bailarinos ou “pessoas do palco” dá ao livro um tempero diferente – embora os textos dos artistas da dança não sejam menos brilhantes do que os dos autores não-dançantes. O livro é para ser lido por quem deseja conhecer o princípio da história de uma companhia recém-nascida ou para quem deseja aprimorar o olhar sobre a arte que dizem ser pouco valorizada em nosso país. A diversidade entre os autores que observam e descrevem o dançar é o que torna os textos de que é composto o livro, que poderia ser apenas belo, mais atraentes.
O leitor de Primeira Estação pode não conhecer nenhum balé de repertório e nem sequer saber em que consiste um plié, mas, se não terminar o livro transformado – como provavelmente acontece com os que, como eu, são, por ofício, dançantes - , certamente guardará a experiência enriquecedora para, quando solicitado, lançar sobre a dança – ou qualquer outra manifestação do corpo – um olhar mais apurado e generoso; de quem, no decorrer de algumas páginas, conheceu parte do que a dança tem de melhor.


Primeira Estação: Ensaios Sobre a São Paulo Companhia de Dança - edição bilíngüe (português/inglês); Inês Bogéa (Org.) - 336 páginas - Imprensa Oficial