Gosto de pensar que sou escolhida por determinados livros ou autores que desconheço, por isso evito ler, ver ou ouvir resenhas de livros que me pareçam interessantes. Pelo mesmo motivo, costumo rejeitar indicações de leitura vindas de pessoas próximas ou distantes.
Quem me sugeriu a leitura de Vermelho Amargo foi a Tati (dona do No país das entrelinhas), que tem bom gosto literário, é sensível e escreve muitíssimo bem. Ela disse que a escrita do Bartolomeu lembrava o que escrevo e que, ao ler o livro, lembrou de mim. Decidi ouvir as vozes da gratidão, em vez de me submeter às falsas certezas da arrogância, e fiz uma ótima escolha.
Vermelho Amargo me colocou em contato com uma melancolia a que me dou direito, que muitas vezes é considerada quase um crime entre o povo e os autores de um Brasil alegre e solar com o qual não me identifico.
Não sei se a Tati sabe que faz muitos anos que perdi a minha mãe (creio que não sabia), mas, no livro, o autor discorre sobre a ausência da mãe morta ainda na sua infância e sobre como essa ausência reverbera nos acontecimentos, reações e sentimentos, durante o passar dos anos e da vida que nos parece sempre longa demais.
Me apaixonei não só pela edição maravilhosa do pequeno livro de capa dura, que tem o corte e a impressão em vermelho, ou pela prosa poética deslumbrante tecida por Bartolomeu Campos de Queirós. Me apaixonei pelo livro como por um espelho, porque me vi em cada uma das palavras e sensações. Me vi nas sentenças inevitáveis provocadas pela mais dolorosa das ausências. Encontrei nas palavras do autor a delicadeza, as possibilidades do belo diante da lucidez assombrosa, no cumprimento de um destino sempre rude.
Em Vermelho Amargo pude perceber que a cortante e dolorosa sensação de abandono não precisa, necessariamente, ser fruto da minha amada solidão, mas pode advir do excesso de amor; porque o amor transborda e sufoca aquele que ama quando a mãe já não existe para recebê-lo incondicionalmente. Mesmo que para toda a família a vida transcorra com naturalidade, há aqueles em quem a ausência - que o passar do tempo não ameniza e torna cada vez mais profunda - jamais deixará de doer.
Li boa parte do livro aos soluços, imersa em lágrimas. Ainda assim, secretamente satisfeita e imensamente feliz. A partir de um gesto de afeto, vivi mais uma oportunidade de me reencontrar.
Vermelho Amargo - Bartolomeu Campos de Queirós - 75 páginas - Cosac Naify