30 de nov. de 2012

Do afeto

Hoje terminamos a caixa para guardar discos de vinil. Minha avó fez a parte mais bonita, a tampa craquelada. Extensos veios dourados na planície cor de cereja. A mim couberam a pintura lisa, a colocação das rodinhas transparentes escolhidas por ela e a aplicação do verniz em spray, a proteção brilhosa do despertador da rinite esquecida.
Mamão dulcíssimo no desjejum, às seis. Fiz pão integral com sementes de chia para o café da manhã das minhas meninas, que despertam quase sempre depois das dez e meia.
Manoel de Barros, gargalhadas, panos de prato pintados, aplicações e bordados. Marisa Monte, passa-fita, estampas e sianinha. Telenovelas exibidas para o vazio: desperdício sem culpa.
No final da noite, como em todas as outras noites, florais, chá-chá-chá, beijos e abraços - substitutos da monótona oração ao deus descrente.

Meu sono não vem.

O aroma do bolo de nozes perfuma a madrugada; dizem alguns vizinhos que ele atravessa a garagem e que chega a dobrar a esquina nos dias mais claros. Antes de renascer bocas adentro, ultrapassamos os quintais.