Não sei como as pessoas vivem tranquilamente depois de um livro do Vila-Matas. Não sei se as pessoas são capazes de viver tranquilamente depois de um livro do Vila-Matas.
"Talvez a literatura seja isto: inventar outra vida que bem poderia ser a nossa, inventar um duplo."
O mal de Montano é narrado com por um um pai que sofre o mal de Montano e se diz preocupado com o filho, um escritor também acometido pela doença da literatura. O livro parece dar continuidade às reflexões feitas pelo autor em Bartleby e Companhia, porque nele Vila-Matas se refere novamente aos escritores que, mesmo doentes de literatura, desistiram do ofício de escrever.
Como os outros livros do autor, O mal de Montano é um labirinto repleto de referências literárias. Encontrei nele muitos dos meus autores favoritos e alguns daqueles que escreveram livros que estão na minha crescente lista de desejos; apesar da inquietude provocada pelos temas abordados, me senti confortável porque, durante a leitura, estava entre velhos conhecidos. Há também menções a alguns dos livros que amo, como O Castelo, do Kafka, e A Montanha Mágica, do Thomas Mann, que me deixaram desejosa de releituras a partir do olhar proposto pelo autor catalão.
'"Escrever", diz Lobo Antunes, "é como se drogar, começa-se por puro prazer, e acaba organizando-se a vida como os drogados, em torno do vício."'
Terminei a leitura com a sensação de que a literatura é esperança e causa perdida, e de que há muito a ser dito e escrito através de fórmulas que podem ou não se esgotar. A literatura é um mistério, um mergulho muitas vezes doloroso no incerto, mas é também uma grande fazedora de ironias. A história contada em O mal de Montano é a história dos doentes de literatura, uma história um pouco assustadora que pode libertar; sobretudo aqueles que, como eu, convivem com "O mal".
O mal de Montano - Enrique Vila-Matas - 328 páginas - Cosac Naify